domingo, 19 de fevereiro de 2017

“Práticas de combate ao machismo na escola”

Prof. Dtnd. Francisco Thiago Silva – SEDF / UniProjeção[1]

         Desde que Eva - a figura bíblica do gênesis - decidiu tomar uma decisão autônoma, sem a devida consulta e/ou permissão de Adão - primeira criatura - e imagem “masculina” à semelhança do criador que resultou na expulsão de ambos do paraíso, a figura feminina passou a representar o próprio pecado na construção do pensamento cristão ocidental. Sendo responsabilidade eterna da mulher na Terra obedecer a seu senhor, gerar filhos “machos” e ser submissa em toda sua existência, como um meio de redimir a escolha da primeira mulher que habitou a Terra.
         Muitos séculos passaram desde então e o cenário atual de início do século XXI demonstra que a famosa passagem bíblica e seus desdobramentos já não representa nossa realidade. As mulheres em suas diferentes representações de raça, classe, cor, gênero e sexualidade tomam as próprias decisões e galgam o seu espaço no mercado de trabalho e na sociedade. Embora o mito religioso em torno de Adão e Eva ainda gravite em torno das relações parentais, patriarcais e machistas que sustentaram o Brasil, desde a invasão portuguesa. Muitos ainda são os casos de feminicídio, violência doméstica, estupros e assédio em nossa sociedade que alimentam o fenômeno social do machismo e do sexismo.  
         A Lei Nº 5.806, de 26 de janeiro de 2017, publicada no DODF é mais uma tentativa de reforçar na Rede Pública de Ensino práticas de combate às manifestações discriminatórias contra as mulheres. E antes que muitos e muitas possam refutar a matéria da Lei, a partir do senso comum, é preciso problematizar algumas questões que fazem parte da discussão: foram as mulheres que mais sofreram com o patriarcalismo no Brasil – isso, entretanto, não as torna simples vítimas, mas sujeito de sua própria história-, portanto é um equívoco imaginar que devam existir ações de enfrentamento a uma suposta superioridade feminina com relação à masculina; é recomendado cautela ao usar o termo “empoderamento”, isso na prática significa tirar o poder de um grupo e passar a outro que, alterando de forma maniqueísta nesta relação social; as questões feministas se perdem quando são totalmente desvinculadas das de raça e classe.
         Na verdade o que se deve buscar, sobretudo na educação, é a rescrita da história da mulher no Brasil e a ampliação de debates que possam formar estudantes comprometidos com esta pauta, independente do sexo e/ou gênero a que pertençam.
         É preciso reforçar que nas últimas duas décadas, especificamente, o assunto tem povoado a agenda e tem se materializado em algumas políticas públicas que fizeram avançar a temática no campo educacional e curricular. Podemos citar algumas delas: os textos legais da CF/88, da LDB/96, dos PCN’S/97, as extintas SECADI, SEPM e SEPPIR, o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, etc. No cenário local há a previsão de ações de combate ao racismo e ao machismo na Lei Orgânica, no PPP da SEDF, no Currículo em Movimento da SEDF, por meio de atividades e projetos pedagógicos (realizados em muitas escolas), cursos de aperfeiçoamento como o “Vidas Plurais” e o “GDE – Gênero e Diversidade na Escola” realizados pela parceria SEDF e UnB já formaram inúmeros profissionais da educação.
         A Lei é mais um instrumento normativo que poderá consolidar essas práticas. Porém, enquanto o assunto não fizer parte do Projeto Pedagógico das Instituições de Ensino, com ampla participação de toda a comunidade escolar, teremos práticas isoladas e descoladas das grandes questões que fazem parte do item. O caso é que racismo, machismo, feminismo, gênero, sexualidade e outros temas considerados ainda polêmicos só avançam se estiverem estruturando o currículo escolar e o da formação das professoras e professores em seus diferentes níveis.



[1] Doutorando em Educação e Currículo pela Faculdade de Educação – UnB. Mestre em Educação e Currículo (UnB). Especialista em História e Cultura Afro-brasileira. Graduado em História e Pedagogia. Professor da SEDF e do Centro Universitário Projeção. E-mail: fthiago2002@yahoo.com.br. Blog: http://professorfranciscothiago.blogspot.com.br/


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